por Paulo da Vida Athos.
Exceto se crermos que houve
uma conspiração geral que deliberadamente permitiu o confronto entre
traficantes da Rocinha e traficantes invasores, para que se matassem,
conspiração essa que envolveu todas as áreas e níveis do sistema de segurança,
o que nos lançaria no caos, temos que concluir que na verdade não temos uma
política pública de segurança no Estado.
Segundo se noticiou, a invasão
era de conhecimento era de conhecimento da Secretaria de Segurança, do comando
da PM, da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) e da 15 DP (Gávea).
O subsecretário de
Inteligência da Secretaria de Segurança, coronel Romeu Antonio Ferreira teria
dito que na sexta-feira dia 10de fevereiro ligou para o coronel Pitta, chefe do
Serviço Reservado da PM (PM-2) no QG da corporação, informando que traficantes
de várias favelas planejavam invadir a Rocinha antes do carnaval. A informação
foi repassada ao 23 BPM (Leblon) e a todas as unidades operacionais da PM, como
os batalhões de Choque e de Operações Especiais.
O comandante-geral da PM,
coronel Hudson de Aguiar,disse que, na mesma data a PMERJ foi informada, pela
Subsecretaria de Inteligência, de que poderia estar sendo articulada uma
tentativa de invasão da Rocinha antes do carnaval, e que disso teve
conhecimento o coronel Hudson, o comandante do 23 BPM, Norberto Mendes, decidiu
reforçar o patrulhamento nos acessos à favela.
A Subsecretaria de Segurança e
Inteligência (SSI) recebeu em 3 de fevereiro da Secretaria de Administração
Penitenciária informações sobre o ataque à Rocinha, e que os invasores usariam
como base as favelas do Pavão-Pavãozinho e do Cantagalo. Informação conseguida
graças à gravação de uma conversa telefônica do chefe do tráfico do
Pavão-Pavãozinho preso em Bangu III. O subsecretário de Inteligência, Romeu Antônio
Ferreira, confirmou ter repassado a informação aos serviços de inteligência das
polícias Civil e Militar.
Segundo o ilustre secretário
de Segurança Marcelo Itagiba, não teria havido falha ou desinformação entre os
setores da segurança pública vez que a PM agira “corretamente ao limitar-se a
manter o cerco à favela, evitando o confronto direto com os traficantes, que se
enfrentaram por três horas, deixando às escuras grande parte da comunidade e da
Gávea”. Se a ação dos criminosos fosse em um bairro da zona sul do Rio, mesmo
às escuras, iriam aguardar a alvorada para agir? A tropa tem medo do escuro,
senhor secretário?
Não se pode levar a sério tais
declarações. Exceto se crermos em uma conspiração. Falha não houve na
informação: houve apenas na execução preventiva e ostensiva policial. Fica
claro que todo mundo sabia de tudo. Quanto a manter cerco na favela, esperando
o dia raiar, enquanto traficantes matam inocentes? Ora, qualquer pessoa
medianamente inteligente, sem ter qualquer curso ou profissionalização em
segurança e estratégia, sabe que o cerco deveria ter ocorrido antes dos
invasores chegarem à Rocinha e de preferência no local em que estavam reunidos
antes de atravessarem a cidade para invadir outra favela. Isso é óbvio.
Sabemos que esse discurso é
aquele blá blá blá de sempre: -“Não podemos invadir pois colocaremos a vida de
inocentes em risco”. Conversa fiada. Nunca se importaram em atirar com fuzis
entre becos de favelas. Contem as vítimas das invasões policiais contra os
nossos guetos ao longo dessa última década. Crianças e trabalhadores morrem ou
são feridos costumeiramente. Até defunto no caixão já encontrou bala perdida no
Rio de Janeiro. E nesse caso específico, mesmo quem é contra invasões policiais
em favelas, como eu, entenderia a necessidade de assim agir.
Não era caso de esperar o dia
raiar. Não era caso de esperar a invasão ocorrer para depois “a manter o cerco
à favela, evitando o confronto direto com os traficantes”. Tinha que ter agido
antes da invasão. Sabiam onde estavam reunidos os invasores, sabiam que
invadiriam antes do carnaval. Ou então: que se cercasse a Rocinha: mas antes da
invasão. Quem chegasse, a polícia agiria com inteligência, e os prenderia.
Seria pedir muito pedir que a polícia agisse com inteligência? Mas ocorreu o
inverso. Permitiram a barbárie.
Agora, vem a mídia e setores
de da própria secretaria de segurança pública tentar crucificar o delegado
Marcos Alexandre Reimão. Pois bateram na porta errada.
Para quem não sabe e para quem
esqueceu, o delegado Marcos Reimão foi quem acabou praticamente com os
seqüestros no Rio de Janeiro. Crime que atingia, por sua característica e
objetivo, a classe favorecida.
O número de casos de
seqüestros na década de 90 no Rio de janeiro era estratosférico. Segundo a
Secretaria de Estado de Segurança Pública (Subsecretaria de Planejamento
Operacional., Publicado no Anuário Estatístico do Estado do Rio de Janeiro de
1998), tínhamos o seguinte quadro: seqüestros 1990 (91), 1991 (91), 1992 (124),
1993 (64), 1994 (90), 1995 (122), 1996 (68), 1997 (59), 1998 (18).
É quando surge o Dr. Reimão à
frente da DAS (Divisão Anti Seqüestros) em novembro de 1997. Com o slogan que
ficou conhecido no meio policial e no submundo do crime, “É DAS ou desce”,
cunhado por Reimão, praticamente se extinguiu até hoje o crime de seqüestro no
Rio de Janeiro.
O Dr. Reimão é um policial
sério, sem rabo-preso. Não é daqueles delegados de gabinete que mandam seus
homens irem ao campo de batalha e fica no pijama. É homem de levantar de
madrugada e chamar a equipe toda que se apresenta inteira e íntegra, a qualquer
hora do dia ou da noite para combater qualquer combate. Tendo o Dr. Reimão á
frente, o CORE tem sido o único órgão que trabalha para a cidade e não para
aparecer na mídia. Se aparece, é em função do trabalho que executa. Quem
acompanha a crônica policial sabe disso.
Não a toa o Dr. Reimão é tão
admirado e amado por seus comandados quanto odiado por aqueles que dele sentem
inveja. Agora, a mesma mídia que o enalteceu o responsabiliza, por essa falha
gritante no caso da invasão á Rocinha. Creio que aí existe uma conspiração sim,
mas contra o Dr. Reimão.
Mas ele é uma reserva moral da
Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro. Um homem íntegro, incorruptível e
líder. Um homem de bem e do bem. Não sou um amigo a defender outro. Aliás,
muito provavelmente ele nem sabe quem sou. Mas eu sei quem ele é e o que é para
seus companheiros de combate e para a sociedade. Pudesse escolher: seria ele o
Secretário de Segurança, não fosse a cisão histórica entre a policia civil e
militar.
Não posso calar diante das
insinuações contra o CORE e seu comandante. Se houve uma falha e se essa falha
não foi uma conspiração para que traficantes se matassem (mas tudo saiu do
controle e inocentes foram as grandes vítimas), foi uma falha geral. Normal nos
setores de segurança pública carioca, que nunca primaram pela inteligência.
Resumindo, nem o ilustre
senhor Secretário de Segurança, nem ninguém pode cobrar coisa alguma do Dr.
Reimão, sem antes cobrar de si próprio.
Quando se acabou com os
seqüestros que atingiam nossas elites, trabalhou-se com inteligência e
tecnologia. Como o tráfico até aqui atingia os desvalidos, e como isso está
mudando e aos poucos já ganhou os contornos de uma guerra civil, descendo os
morros, saindo dos guetos, ganhando as ruas da zona sul, ecoando por toda a
cidade, pode ser que as coisas mudem.
Pode ser que casos como esses
não mais se repitam, que a polícia policie, que as informações sejam
aproveitadas, que o poder público não abandone à própria sorte os despossuídos,
que as elites abram mão de parte de suas posses em favor dos desvalidos.
Torço para que se estabeleça
um marco para o implemento de justiça social.
E, principalmente, que nossa
polícia perca o medo do escuro...
Nenhum comentário:
Postar um comentário