terça-feira, dezembro 30, 2008

PRECE POR 2009...
















PRECE POR 2009...



É poente 2008. Sol que se põe no céu do tempo, de um tempo que deixou marcas profundas na Terra e nos homens, e cicatrizes também.


Marcas e cicatrizes têm semelhanças, mas são diferentes.


As marcas cinzelam a alma que se amolda pela experiência da lágrima ou do sorriso, fazendo o homem se tornar maior e a Terra melhor.


Cicatrizes mutilam, amputam, ceifam sonhos e deixam a Terra mais pobre.


Não por culpa do ano poente, mas sim do homem, tivemos muito mais cicatrizes que marcas e a Vida e a Natureza não nos perdoarão por isso.


As marcas que mais me tocaram de forma indelével, foram quase todas de atos de heroísmo do homem diante do imponderável.


Muitos foram os heróis anônimos, em Santa Catarina.


Esses heróis anônimos é que ainda dão esperança e paciência a Deus.


As cicatrizes também tiveram origem no mesmo homem, anônimo ou não, como aqueles que não nos permitirão esquecer Isabela ou menino João Roberto, ambos vítimas da insanidade humana, a mesma insanidade que é regente na Faixa de Gaza no momento crepuscular em que escrevo, que já ceifou mais de meia centena de vidas e muitas mais ceifará, bem como as quase 50 mil pessoas que foram assassinadas nessa guerra não declarada que também vivemos no Brasil.


Não culpo 2008, não culpo seus orixás regentes por ordem divina de Olorum – para uns Ogum, Yemanjá, Oxossi e Oxum - nem culpo o Deus dos cristãos, nem o dos muçulmanos, nem o dos judeus, assim como não culparei Yemanjá, Xangô e Oxossi, que, dizem alguns, mesmo sem ter o ano de 2009 nascido, serão os regentes do que se avizinha.


Culpo o homem, ainda que criatura de Deus.


O homem é Sua única obra imperfeita; se tal diga for blasfêmia, sou herege e não mudarei uma vírgula.


O homem alterou a Terra, violentando-a.


O homem desafiou a natureza, como um dia desafiou os deuses do Olimpo e Zeus dividiu-o em dois, encarregando Apolo de fechar suas feridas.


Mas não aprendeu aquela lição.


O homem está se separando da Vida, pois o que o une à Vida é o Amor.


Não existe outro caminho que não seja esse para que todos vivamos com felicidade e paz; não existe outro caminho que não seja o amor.


A maioria da humanidade conhece o texto ocidental mais desrespeitado:


Lucas 10

25 Levantou-se um doutor da lei e, para pô-lo à prova, perguntou: Mestre, que devo fazer para possuir a vida eterna?

6 Disse-lhe Jesus: Que está escrito na lei? Como é que lês?

7 Respondeu ele: Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu pensamento (Dt 6,5); e a teu próximo como a ti mesmo (Lv 19,18).



O Islam invoca para a paz e a não agressão, dizendo:


“Quem matar uma pessoa, sem que esta tenha cometido homicídio ou semeado a corrupção na terra, será considerado como se tivesse assassinado toda a humanidade; quem a salvar, será reputado como se tivesse salvo toda a humanidade” (5:32).



Lendo David Seidner, aprendi a seguinte passagem sobre a Toráh:


Aconteceu um dia que um não-judeu chegou ao grande rabino Shammai e lhe disse: Faz-me prosélito (convertido ao Judaísmo) sob a condição de que me ensines a Toráh inteira, durante fico parado em um pé só. Esse o empurrou com o bastão que tinha na mão. A seguir veio a Hillel, e este o fez prosélito e lhe disse: O que tu não estimas (que te façam), isso também não faças ao teu próximo. Isso é toda a Torá, e todo o restante não é senão explicação: vai e a aprende!” (Talmude Babilônico, Sabbat 31a).



Em resumo, todos os livros sagrados apontam para um caminho único de salvação: o Amor.


Na contra-mão de tudo, o homem segue seus descaminhos.


Mas existe um pequeno-grande-exército do qual todos devemos fazer parte.


Um exército que prega que devemos amar o nosso Deus, o nosso próximo, a nossa casa, o nosso irmão, o nosso cão, a nossa grama, a árvore que nos dá sombra, o mananciais que aplacam nossa sede, a comida que nos sacia a fome, os que são sacrificados para comermos, os mares que ligam nossos continentes, os nossos continentes, o que neles estão contidos, os seus e as aves que cortam a imensidão do espaço, nada sacrificando sem ser em nome do Amor e da Vida.


Te convoco para dele fazer parte.


Sem arma, para amar com todo o amor.


Por 2009, amem.


Amém.



Paulo da Vida Athos



quinta-feira, outubro 23, 2008

PRESENÇA DA AUSÊNCIA NÃO É AUSÊNCIA DE AMOR


Sim, ando sumido. Mas estejam certos de que não esqueço das pessoas queridas. Estão nas minhas preces e nas manhãs e nas tardes mais bonitas de minha vida.


Não tenho os dias ligeiros. Tenho as horas ligeiras. Parece igual, mas é diferente. Não corro pelo tempo mas o Tempo corre em mim.


Não dá para entender, não tentem.


Sou dessas pressas que podem parar para observar as tardes de primavera passarem (não sei se repararam, mas são mais azuis os seus céus), e me encontro nessas horas perdidas em contemplação, como que a querer reter na memória as cores e perfumes que chegam a mim, ou que imagino que chegam.


Não tenho falado muito com essas pessoas queridas por meu coração. Não tanto quanto deveria, e muito menos que meu querer.


As vezes me assusto com o fato de perceber que não disse os tantos ‘eu te amo’ que existem em meu querer, aos amores que vivem ao meu redor, a mim mesmo e à Vida.


Passado o susto, logo esqueço e dado por esquecido fica emudecido tantos ‘eu te amo’ que temo pagar por isso.


Sou um bem-aventurado.


Desses que a Vida escolheu para amar, para colocar a mesa farta, os amigos pródigos e os amores plenos.


A mulher que a Vida escolheu entre tantas e maravilhosas mulheres que colocou em meus caminhos, é bela, bela e única, forte e doce, brisa e rocha, cinzelada em valores humanos e morais ímpares; colocou o fruto bendito para meu deleite e proteção.


Com ela, uma legião de anjos veio junto. E, me adotaram em amor.


Meus filhos – que aprendi com Gibran serem da Vida – são tão fundamentais em minha vida que perder qualquer deles seria fatalmente perder minha vida ou a vontade de permanecer com ela.


Claro que sempre existe uma sombra. Dizem que nada é humanamente perfeito, portanto não sou exceção.


Mas vai passar. Creio naquele que a tudo criou. Creio na Verdade e, crendo nela, sei que ficarei livre um dia dessas sombras: está escrito.


Enquanto isso não se dá, longos serão meus períodos de ausência, com relação aos quais desculpo-me antecipadamente. Ou seja, há aqui um pleito de crédito de desculpas futuras por ausências que virão.


Mas saibam, ou pelo menos se souberem não esqueçam: a presença da ausência não é e jamais será ausência de amor.


Com meu carinho, um beijo e minha saudade de cada um, e de todos.


Paulo da Vida Athos.

domingo, agosto 10, 2008

NÃO SOU HERÓI






NÃO SOU HERÓI



Não quero ser herói. Heróis não choram, não sentem dor.

Heróis não deitam com a angústia, não brigam com a insônia, contando o tempo, os segundos, a toda hora com o coração acelerado ao ouvir uma porta que bate ao longe, o barulho da freada brusca de um carro, ou de uma sirene que corta com seu lamento o silêncio da madrugada, enquanto espera o último filho chegar em casa.

Heróis não se assustam com o telefone que toca no meio da noite madura que se debruça na madrugada chegante, e pulam da cama como o mais imaturo adolescente, sentindo a boca seca, o coração disparar, o corpo tremer, num desassossego de alma impossível de descrever, até que ouve do outro lado uma voz amada dizer:

“- Fica frio, pai, tô numa boa com a galera. Não esquenta que daqui há pouco tô chegando.”

Heróis não ficam ali, babacamente tentando decifrar quem compõe a “galera”, como será essa “boa”, se o lugar é seguro, se existem feras nas sombras, se seu filho está entre lobos com pele de cordeiro, se existe perigo no ar.

Heróis não se preocupam com o futuro, são imortais. Não são como nós que apreensivos muitas vezes perdemos o rumo das palavras, e não conseguimos, debalde as tentativas, mostrar aos nossos filhos a importância de aproveitar o tempo, as oportunidades de poderem estudar sem precisar trabalhar, para acumularem o único tesouro que ninguém pode deles arrebatar, que é o saber.

Heróis não morrem a cada vez que a dúvida os assalta: onde estará meu filho?, com quem minha filha saiu e o que está fazendo?, está com pessoas de bem?, será que sabe perceber o canalha que muitas vezes se esconde em um sorriso cativante?

Heróis não temem os monstros que são essas dúvidas que sitiam nossos dias e roubam nossa paz. Às favas os medos dos amanhãs! Para eles basta fazer como o Super-Homem e girar velozmente até o tempo retroceder para consertarem qualquer estrago. Taí um poderzinho que cairia muito bem em minha vida... qualquer coisa era só um zuuummm!, e pluft!, o tempo retornava ao passado e eu presenteava o futuro com um presente sem estragos. Uma boa, não? Dava até para fazer novamente aquelas provas em que tiveram nota abaixo de sofrível. Mas aí estaria deixando de ser esse herói hipotético para ser um patético vilão e minha ação uma fraude. Não vale.

Não quero ser herói porquê não sou herói e, por não ser herói, não quero ser visto como herói.

Quero que meus filhos saibam que sou apenas uma pessoa comum, frágil como um papel de arroz, ainda que em algumas situações me comporte como a grama ou como o bambuzal ao vento: vergo mas não quebro. Ou quebro por dentro e vou juntando os cacos, num ritual de amor. Sim, muitas vezes é tudo que podemos fazer: juntar cacos de sonhos e de vida e tentar salvar alguma coisa que nos devolva a esperança.

Quantas vezes a vida nos coloca diante de situações que julgávamos não poder suportar e, sabe-se lá de onde, a gente reúne forças e conseguimos nos levantar antes de encerrar a contagem final para continuar a luta, muitas vezes apenas para continuar no corner, apenas apanhando, apenas para ganhar tempo enquanto não encontramos a solução ou a resposta?

Herói não passa por isso, não beija a lona, não vai a nocaute, não junta cacos em ritual de amor, não se sente derrotado em cada derrota de um filho, não sente o gosto do sal que nos sabe em cada lágrima que derramam, sejam elas de desamor ou de dor de amar, da inabilidade de se fazer amar, inerente da imaturidade e do esplendor da juventude, até nisso choramos com e por eles, pois muitas vezes tudo que nos é permitido pela Vida se resume a isso: chorar com eles.

Herói não passa por isso. Aliás, que me lembre não conheço nenhum super-herói que tenha filhos...

Sei que sei amar e luto como leão se preciso for por meus filhos e quando não posso lutar, quando é impossível lutar, faço o que é possível, e se o possível for apenas chorar choro junto com eles.

Afinal, sou simplesmente pai.


Paulo David
Rio, 10 de agosto de 2008.
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sexta-feira, junho 27, 2008


JULIANA LATINA DAVID




(Ou: saudades de uma mochileira).


Minha saudade te busca

Em cada esquina de Montevidéu,

Assim como andou se queimando,

Na Cordilheira dos Andes

A tua procura.


Teimosa, buscou atenta

Em cada rosa

De cada casa rosada

E em cada esquina florida

Te encontrar e se tornou perdida.


E para meu contragosto,

Chorosa, minha alma egoísta

Atravessou Buenos Aires,

E todas as praças de maio,

Pra tentar te encontrar nesse agosto.


Meus olhos reclamam nostálgicos a imagem tua,

Enquanto minha alma, nua,

Mergulha no oceano imenso de tua ausência.


Mas, demores o quanto puder!


A Vida é uma imensa e maravilhosa aventura,

E o tempo não torna jamais.


O que torna são lembranças!

Ninguém pode ser feliz em seu passado

Nem em seu futuro.


É no hoje!

Belo, emocionante,

Encantador e encantado!

Sim, dileta amada...

É no agora que bailam no éter

A Paixão e a Alma apaixonada.

Não antes.

Jamais, depois.


Os dias são portas que se abrem para nosso espanto,

E para as lições que amadurecem nossa alma.


Viva! Cada minuto desses como se fosse ele o último!

Mas guardando-se para o minuto que virá depois...


Que a Vida cuide de ti!

Eu? Apenas amo.


E, te espero...


De como sentir saudade...


por Paulo da Vida Athos.


Sim, a saudade é isso mesmo,
essa presença da ausência de um lugar, de uma pessoa ou de um pedaço de nós que ficou no caminho. Um sentimento, uma sensação de alma, um perfume de lembrança que surge do nada, de uma esquina por onde não mais passamos ou um cheiro que a brisa trouxe. Quem tem saudade tem lembranças e quem tem lembranças tem recordações e quem tem recordações, é rico! Sinto carinho por todas as minhas saudades...

terça-feira, junho 17, 2008


TEMPO DE DESPERTAR


Por Paulo da Vida Athos.

A história de toda política de segurança da qual faz parte uma policia militarizada, é sempre uma estrondosa série de fracassos. Não se combate o crime com estratégia militar em uma cidade, impunemente. Ou ocorrerão os danos paralelos, no jargão militar, ou abuso contra o inimigo. Mas quando o inimigo fala a mesma língua e está sob a égide da mesma Constituição, como diria Juvenal Antena: -“muita calma nessa hora.”

Wellington Gonzaga Costa, de 19 anos, Marcos Paulo da Silva, de 17, e David Wilson Florêncio da Silva, de 24, foram abordados por soldados do exército quando chegavam de uma festa, já próximos de sua casa, em uma favela no centro do Rio de Janeiro; discutiram com eles e foram encaminhados ao comandante do grupo militar que atua na região e, em seguida, conforme nota do Exército, liberados na Avenida Presidente Vargas, no Centro do Rio. Menos de 36 horas depois, foram encontrados mortos no Aterro Sanitário de Gramacho, em Duque de Caxias, município da baixada fluminense.

Não há como negar ou fechar os olhos, estamos vivendo uma das quadras mais sombrias da história contemporânea do Brasil, particularmente no Rio de Janeiro. As milícias, o envolvimento de parte das forças de segurança com elas, a criminalização da pobreza, o flagrante desrespeito aos direitos humanos.

Seguramente nunca se matou e torturou tanto como hoje.

Existem aqueles que até conseguem exercer a omissão nossa de cada dia e, ainda assim, mesmo diante do quadro sinistro que se desenha, dormir o sono dos justos. Mas isso nada tem a ver com justiça. É sono de gente covarde ou ignorante, de quem não sabe nada do passado, de quem despreza a democracia conquistada com tanta vida e liberdade perdida, de quem não conhece o valor dessas liberdades herdadas do sangue e dos gritos que povoaram os porões desse passado recente vivido pelo Brasil, de quem não conheceu o mostro da supressão dos direitos civis.

E tal quadro fica mais preocupante quando notadamente parte de nossos operadores do Direito se engajam na aplicação de uma Justiça com dois pesos e duas medidas, grifando a existência de cidadãos de segunda classe. Ao ficar estabelecido conscientemente que existem locais que são violentados em seu território e onde a Constituição é rasgada em nome da segurança pública e seus moradores não têm garantidos seus direitos fundamentais - sem sequer ser necessária a edição de um AI5, como no passado - é por que temos uma sociedade doente e um sistema legal viciado.

Já vimos esse filme antes, quando não havia tanto cinismo e os nomes eram dados aos bois de forma clara, como se fosse um aviso aos navegantes: “Esquadrão da Morte”, “Mão Branca”, e coisas assim, para os pobres; e DOI-CODI, DOPS, CENIMAR, etc. para aqueles considerados inimigos do regime e que pertenciam em sua maioria à classe média.

Vivíamos então o que se convencionou chamar de “anos de chumbo”, e a diferença para hoje é apenas uma: as vítimas de nosso cinismo pertencem em sua totalidade à camada menos favorecida da sociedade.

Aplica-se escancaradamente o Direito Penal do Inimigo, preconizado por Günther Jakobs, e parte do poder judiciário e do ministério público está debruçada nessa empreitada, legitimando-a. E esse Estado-Policial que se sobrepõe ao Estado-Democrático fica assombrosamente exposto ao se verificar que até a Suprema Corte, última sentinela da Democracia, foi violada impunemente.

Ao se atentar contra aqueles que são os garantidores da norma legal-constitucional - não existe direito sem quem o garanta - colocaram exposta a realidade de termos um Brasil grampeado, razão pela qual, apenas no Rio de Janeiro, temos nada mais nada menos que 3.825 telefones interceptados em 774 investigações. Ou seja: vive-se no Brasil um controle mais sofisticado e incisivo do que o que foi colocado em prática durante o regime oriundo do golpe de 64. Isso vez que constatado que, para cada telefone interceptado legalmente um número muito maior o é de forma ilegal, mascarado e inserido entre os números de terminais efetivamente alvos de investigação séria. E se temperarmos isso com a prática de parte de nossos juízes aceitarem que o resultado dessas interceptações seja editado antes de virar prova em processo penal: delineamos uma nova ditadura: a das ilhas de edição policial. E todos estão sujeitos a esse veneno que fulmina, antes de qualquer outro, a própria Democracia.

E tudo isso começou com nossa omissão diante dos abusos sofridos na última década pelas classes socias menos favorecidas. Afinal, para nós eles eram "os outros". Mas não nos iludamos mais. Basta! Ao permitimos que pessoas de nossas classes mais pobres, que vivem em nossos guetos e favelas, sejam assassinadas todos os dias em nome de uma pseudo política de segurança pública, em flagrante violação aos mais comezinhos princípios que deveriam sustentar um Estado de Direito Democrático, estamos alimentando um monstro que não conhece limites, medidas e fronteiras.

Acredito que o Exército está fazendo um “laboratório” no Haiti, para enfrentamento com a criminalidade do Rio de Janeiro, e com a criminalidade urbana de modo geral, em território nacional. Não está lá a passeio. Vivem uma guerra urbana como a que se dará por aqui em futuro não muito distante, caso as autoridades não usem a Inteligência - termo militar que traduz “um processo informacional proativo que conduz à melhor tomada de decisão, seja ela estratégica ou operacional” – em lugar da força desproporcional. Afinal, já não apenas terá o tráfico como inimigo. Em um segundo momento terá as milícias que já estão atacando delegacia policial e colocando a cabeça de delegados a prêmio.

Mas, se como resultado desse “laboratório” tivermos desaparecimento de pessoas: não contem comigo, nem com meu silêncio!

Primeiro que se fique muito claro que o cidadão tem o direito inquestionável de exigir segurança pública através do aparelho policial. Ninguém em sã consciência quer que a polícia assista de braços cruzados ações criminosas. Mas o que temos de fato no Rio de Janeiro, nesses primeiros tempos de governo Cabral, é isso fica bastante claro, é que está sendo empregado o princípio de que é melhor matar do que prender.

O site Brasil de Fato informa que “o professor Ignácio Cano, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), fez uma pesquisa e constatou que, em 70% dos casos registrados como "auto de resistência", homicídios em que a polícia informa que trocava tiros com a vítima, os tiros foram dados pelas costas e a curta distância. Como não há ninguém que troque tiros de costas, foram, na realidade, execuções sumárias.”

Não importa muito se a morte atinge inocentes e o número criminoso de vítimas nas operações policiais em nossas favelas confirma isso. Segundo o ISP, pelo menos 21 pessoas morreram vítimas de balas perdidas em 2007 no Rio, ante 19 em 2006. O número oficial de vítimas não fatais também aumentou no período, de 205 para 258, segundo o “Relatório Temático Bala Perdida”, divulgado pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), órgão vinculado à Secretaria de Segurança do Rio.

Essa política de confronto, burra e letal, apenas deixa claro que a classe pobre foi eleita para ser criminalizada e a mídia, instrumento do poder, apenas faz seu papel histórico: desvia nossos olhos dessa realidade brutal, dessa chacina oficial que estamos chancelando com nosso silêncio.

A morte desses três jovens não ocorreu na zona sul do Rio ou de São Paulo. Logo, não terá nem de leve a repercussão que houve na morte da menina paulista. Lamentavelmente amanhã estarão dizendo que “a manifestação popular foi orquestrada pelo tráfico local”, que será desmentida pela foto que ilustra esse texto: a mãe de um dos executados. Não podemos aceitar isso e as autoridades constituídas devem um esclarecimento cabal à sociedade. Ou é isso ou não somos mais uma sociedade, mas sim uma associação criminosa.

Não calarei. Senão pela morte brutal e sem sentido desses três jovens, pelo menos em respeito àqueles que deram sua vida pela Democracia.

Faço isso hoje, enquanto posso.

Amanhã, ninguém sabe...


Fotos: Globo online

sábado, abril 19, 2008

DIA DO ÍNDIO


Hoje é o Dia do Índio.


Não temos muito a comemorar. Aliás, apenas eles têm alguma coisa a comemorar no Brasil: não terem sido, ainda, extintos. No mais é dor mesmo. Quinhentos anos de ignomínia, humilhação, chacina, isso foi tudo que demos a eles nesse tempo, cara-pálida. E continuamos dando.

O generalíssimo Augusto Heleno, não desmerecendo o nome imperial, afirmou no dia 16 próximo passado que nós “estamos cada vez mais aumentando a extensão das terras indígenas na faixa de fronteira e caminhando numa direção que me preocupa. Pode não ser uma ameaça iminente, mas ela merece ser discutida e aprofundada", e completou:

" -Poderão representar um risco para a soberania nacional".

A preocupação se dá em razão da “segurança nacional” e não em função da segurança de mais uma ou mais nação indígena em risco, que, à luz do direito e da razão, são as legítimas donas da terra que nós, caras-pálidas chacinadores, alcunhamos de Brasil. Brasil para eles é sinônimo de brasil mesmo, brasa acesa em que assamos seus sonhos assim como o fizemos com a maior parte de sua cultura e esperança.

Há um cálculo não confirmado que existem hoje, em terras usurpadas por nós, cerca de seiscentos mil índios. O IBGE afiança que cerca de pouco mais de setecentos mil se declararam índios no último censo. Há também um cálculo estimativo de que cerca de mil nações indígenas, contando entre dois e quatro milhões de indivíduos, viviam nesse paraíso quando os europeus trouxeram para cá Anhangüera, fazendo tudo isso virar um inferno para eles. Não, não é um erro histórico construído pela traição de minha memória. Não falo de Bartolomeu Bueno da Silva, que deles recebeu esse apelido nos idos de 1680. Falo do diabo mesmo, vez que Anhanguera ou Anhangá, era como se chamava o coisa-ruim para os índios. Anhangabaú em São Paulo, o rio, assim foi chamado graças ao nosso relacionamento com eles: anhangá+bá (malefício do diabo)+y (água, rio): "rio do(s malefícios do) diabo". As margens desse rio eram povoadas de gente ruim como o diabo. Essa gente? Nós, cara-pálida. Daí o nome...

Não penso que daremos um aporá para eles. Não. Nunca devolveremos o que tomamos. Mas que deixemos de turbar sua paz, que demarquemos um pouco do que roubamos de seus ancestrais, que não só a reserva Raposa Serra do Sol seja demarcada e realmente preservada para seus legítimos donos dela usufruírem, mas também todas as outras.

Coisa-ruim, assombração, isso é o que sempre fomos e somos na vida do índio. O que demos a eles em toca do que tomamos (suas terras, seus filhos, sua cultura), foi a morte, a intolerância em forma de genocídio.

Ah!, e o Dia do Índio.

sábado, março 22, 2008

CRIANÇAS SÃO SEMPRE VÍTIMAS: MESMO AS CRIMINOSAS



por Paulo da Vida Athos.


“Jesus, porém, chamando-as para si, disse: Deixai vir a mim as crianças, e não as impeçais, porque de tais é o reino de Deus.” (Lc.18,16)

Na Função Litúrgica da Sexta-feira da Paixão, na Catedral Metropolitana, ontem à tarde, sua eminência o arcebispo do Rio, cardeal Dom Eusébio Oscar Scheid, disse que ainda sejam protegidas pela legislação, as crianças que matam são assassinas. Assim se expressou sua eminência:

“- São assassinas e criminosas, ainda que a lei não as puna”.

Não satisfeito arrematou:

“- Não se pode ser fraterno desrespeitando a vida de quem quer que seja, muito menos de criança inocente”.

Imagino-o, rotundo, diante de uma fasta mesa, cercado por iguarias e vinhos de primeira, afinal sua eminência está acostumada ao fausto, e deliciando-se com sua própria imagem a deitar falação para a massa sobre o tema da campanha da fraternidade, que aborda segurança pública, assistindo-se no jornal das oito.

Que fraternidade prega sua eminência?

O que sua eminência esqueceu, é que no Brasil desde a colônia até o fim do império, no final do século XIX, as crianças excluídas do amor ou do abrigo eram nominadas como "expostos" e "enjeitados". Mas essa exclusão dava-se, como regra, com crianças recém-nascidas. Comumente as abandonavam em locais onde a exposição as fariam ser recolhidas por algum bom samaritano; mas, ordinariamente as deixavam em igrejas e conventos. Era mais comum fazerem assim, vez que acreditavam que Deus as recolheria e, com isso, aliviavam um pouco a consciência. Nasciam, assim, as "rodas dos expostos".

E, quantas mães encontraram nessas rodas a única salvação para o filho! Quantas mães através delas livraram seus filhos da escravidão!

O tempo veio e passou, e a República, que já nasce prostituta das entranhas do Império, começa a largar os filhos desse solo com mais profusão no chão de suas ruas. No século XX a Igreja de sua eminência aposentou as “rodas dos expostos”, pois afinal não era lampião e dispensava para seu fiofó aquela torcida. Aquilo era um problema do Estado, de ordem secular, e não ficava direito a Igreja empregar o dinheiro que vinha do povo em favor do povo. Não! Aquela grana era para a hóstia e para o fausto dos bispos e cardeais, de alguns padres mais chegados, e claro, para o amparo papal, para o rico Estado que não tem crianças abandonadas pelas ruas, ruas de chãos limpos e história nem tanto, chamado Vaticano. Um verdadeiro céu!

Mas, preciso trazer sua eminência para a terra, e já! Alías, só para começar cutucando a onça com vara curta, indago a sua eminência: antes de levantar a bandeira da defesa de embriões, por que não defender menores de rua? Antes de chamá-los assassinos e bandidos, porque a Igreja não os reconheceu e acolheu quando eram ainda apenas as vítimas? Dar uma de político em época de eleição é mole. Não me espantarei se sua eminência começar a pedir que se reduza a idade para a imputabilidade penal. Coisa de político beócio e de gente de má-fé.

“- A pobreza, a miséria, a gravidez na adolescência e a falta de planejamento familiar estão entre as principais causas do abandono das crianças e adolescentes no Brasil”, concluiu o então presidente do Fórum Permanente da Criança e do Adolescente, desembargador Liborni Siqueira do Tribunal de Justiça do Rio.

De fato, a miséria é a mãe do abandono e de todo o resto. Os excluídos são filhos dela. As crianças abandonadas que perambulam por nossas ruas, que não têm uma mesa como a de sua eminência, que cheiram cola e em alguns casos cometem crimes contra o patrimônio e até contra a vida, são filhos de nossa omissão e sua eminência parece não ter percebido.

Não culpo a Igreja nem sua eminência apenas: seria heresia! Culpo também a cada um de nós. Afinal, a classe média só se preocupa mesmo com isso quando a ABADI informa que em tal e qual área os imóveis tiveram desvalorização que chegou a 15% no valor do aluguel, e até 30% na venda, em razão desses seres miseráveis chamados moradores de rua.

Em entrevista para a revista VEJA, Mollie Orshansky, uma das maiores especialistas no assunto disse que: "- A pobreza, tal qual a beleza, está nos olhos de quem a vê". Para efeito estatístico, no entanto, os estudiosos chegaram a uma definição quase matemática sobre o que são miséria e pobreza. Conseguiram estabelecer duas grandes linhas. Uma delas é a linha de pobreza, abaixo da qual estão as pessoas cuja renda não é suficiente para cobrir os custos mínimos de manutenção da vida humana: alimentação, moradia, transporte e vestuário. Isso num cenário em que educação e saúde são fornecidas de graça pelo governo. Outra é a linha de miséria (ou de indigência), que determina quem não consegue ganhar o bastante para garantir aquela que é a mais básica das necessidades: a alimentação. No caso brasileiro, há 53 milhões de pessoas abaixo da linha de pobreza. Destas, 30 milhões vivem entre a linha de pobreza e acima da linha de miséria. Cerca de 23 milhões estariam na situação que se define como indigência ou miséria.

Vinte e três milhões de famintos!

Impossível fechar os olhos como a Igreja faz, como a sociedade faz, como os governantes e políticos fazem. Um dia, pagaremos por esse que é nosso pecado. O educador Vital Didonet disse que a criança é "o rascunho de um texto definitivo. Rascunho no qual se corrige, acrescenta, apaga, sobrepõe e que se aperfeiçoa até chegar à redação final. A criança é o ensaio do adulto. Vive um período que passará". Creio em suas palavras e temo o rascunho que estamos ajudando a fazer.

Melhor iria se sua eminência mantivesse a boca fechada. Se sua eminência não percebeu: no Brasil, todas as crianças são vítimas, mesmo as criminosas!


It was not an act of war in Lebanon

It was not an act of war in Lebanon. It was not an act of war, it was a terrorist act, a terrorist action that Israel carried out against Le...